sexta-feira, 17 de julho de 2009



A Fragmentação do ambiente e a viabilidade
das futuras gerações

ALVES, Cláudio Eduardo da Costa
Acaang – Organização Não Governamental
ongacaang@yahoo.com.br
Registro: 2.942
CNPJ: 05.535.213/0001-31


Introdução


O planeta Terra, após bilhões de anos passando por épocas vulcânicas, gasosas, glaciais, aquecimento e resfriamento, chuvas torrenciais, elevação e retração de oceanos, separação de continentes, placas tectônicas moldando o cenário (inclusive através de terremotos), evolução das diversas formas de vida, enfrenta atualmente, talvez, o maior desafio em toda a sua história: abrigar o ser humano nesta difícil etapa de sua evolução, onde as atividades realizadas pelas suas sociedades descrevem-se não apenas como devastadoras, mas, sobretudo, como ignorantes, pela não compreensão do real valor do TODO.

O espaço físico é relacionado, primordialmente, de duas maneiras básicas: objeto, ou seja, os recursos naturais necessários às atividades humanas (produção social: bens e serviços) e suporte, ou seja, a estrutura física onde as estas atividades ocorrem. Logo, a formação das sociedades evoluiu de uma simples ocupação do espaço para uma situação de transformação cada vez mais ampla e profunda deste espaço. Isto se relaciona, não somente ao uso dos recursos naturais para a produção de bens materiais, mas, principalmente, por uma adequação do ambiente às novas necessidades e modos de vida, através da organização territorial (BARRIOS, 1986).

Nas sociedades primitivas, onde a estratificação em classes era ainda incipiente, todos os membros da comunidade participavam indistintamente das tarefas de reprodução social. As formas espaciais produzidas satisfaziam as necessidades elementares e eram utilizadas, praticamente, sem restrições por todos os membros da comunidade (BARRIOS, 1986).

Quando as sociedades começaram a se agregar e aumentar de número, o próximo passo foi a divisão do trabalho, a fim de manter sua subsistência mais imediata, ou seja: produzir bens alimentícios e materiais. Ao aprofundar-se o processo de divisão social do trabalho, a fixação de uma única atividade como ocupação por toda a vida impõe-se como as bases para a formação das cidades. As antigas comunidades logo ingressaram em um novo estágio de desenvolvimento, através da divisão de classes, condição que tem claras repercussões espaciais, determinando, em primeiro lugar, a diferenciação urbano-rural (BARRIOS, 1986).

De fato, isto vai ao encontro de ROSSINI (1986), onde relata que a partir do momento em que o homem começa a viver em sociedade, surge a necessidade de uma separação entre os trabalhos agrícola e não agrícola o que revela não só uma divisão interna, mas a própria organização do espaço. Esse momento ocorre quando começam a existirem excedentes. É então que surge também a separação entre residência no campo de cultivo e residência em aglomeração.

A divisão das sociedades em classes principia com a transferência desta produção social (bens de consumo) a certos grupos, que passam a ocupar posição de poder no seio destas sociedades. Como concorda e acrescenta SINGER (1973), onde diz que historicamente a divisão das sociedades em classes sociais deve fundar-se em progressos técnicos que tornem possível a produção de excedentes alimentícios no campo e na existência de instituições políticas e culturais capazes de assegurar e justificar a apropriação desses excedentes pelos grupos sociais dominantes.

Numa sociedade estratificada em classes, a forma pela qual se efetua a transformação do meio físico (ambiente) só pode ser compreendida mediante exame dos interesses dos grupos sociais que dirigem a produção (BARRIOS, 1986).

O sistema produtivo estabelecido, a tecnologia desenvolvida e as adaptações ambientais realizadas responderão, portanto, aos fins assinalados por estes grupos dominantes, ou seja, a ORDEM ESTABELECIDA. O espaço modificado começa, então, a surgir não com o resultado puro e simples da evolução sociocultural da humanidade, mas como produto intencional de uma Ordem Estabelecida.

A transformação progressiva desta conformação social em cidades urbanizadas explica o processo de “desenvolvimento” atual, o qual está se expandindo na razão de mais de 2% ao ano, nos países da América do Sul, acarretando, inevitavelmente, uma compressão insuportável às diferentes populações de animais selvagens e seus habitats naturais (TERBORGH, 1992).

Esta expansão da ocupação humana, com este crescimento exponencial, tem levado à redução e à fragmentação de vários biomas do país, podendo levar uma infinidade de organismos ao caminho irreversível da extinção. O resultado prático desta “evolução” humana manifesta-se na unidade básica dos problemas ambientais: a fragmentação de habitats.


A fragmentação do ambiente: causas e implicações


A fragmentação de habitats é uma das mais importantes e difundidas conseqüências da atual dinâmica de uso da terra pelo Homem (BROOKS et al, 2002). ALMEIDA et al. (1998) comentam que quando as características originais de um habitat são alteradas, muitos elementos essenciais à manutenção das espécies da comunidade local desaparecem, tornando assim, inviável a permanência e sobrevivência de uma ou várias espécies.

As causas da degradação ambiental também estão associadas à situações históricas e atuais de iniqüidade social. No Brasil, a fragmentação e redução progressiva de florestas, sobretudo pela ação antrópica, se iniciou na época do “descobrimento” e acentuou-se principalmente nos últimos 200 anos, com a ampliação de áreas destinadas às atividades agropecuárias, industriais e à especulação imobiliária (LEITÃO FILHO, 1982).

A partir da década de 70, o governo brasileiro (receoso do interesse internacional pelas riquezas do país, principalmente Amazônia) percebeu a necessidade política de se estabelecer uma definitiva e reconhecida soberania nacional sobre o território, até mesmo nas suas porções mais isoladas e distantes. Com isso, iniciou um projeto de desenvolvimento e integração do interior do país, que priorizava a ocupação da região com a função de integrá-la ao mercado nacional. Um elemento central para materializar esta integração foi o planejamento e abertura de grandes rodovias que, juntamente com políticas públicas de incentivo ao setor agropecuário, deram uma nova dimensão no acesso às áreas florestais anteriormente inacessíveis.

Na mesma década de 70 tiveram inicio as primeiras discussões sobre a necessidade de se diminuir os impactos antrópicos no planeta e também sobre a importância da biodiversidade e dos riscos de sua perda. Assim, questões como: o que conservar, onde conservar, qual a melhor abordagem, etc, começaram a dominar as pesquisas (SHIMBORI et al., 2003).

Nunca é demais ratificar que o desmatamento causa sérios prejuízos ao meio ambiente, apresentando influência no regime climático regional, na biodiversidade, na degradação do solo e nos recursos hídricos. A complexidade envolvida na temática da conservação impõe certa flexibilidade, criatividade e busca por integração dentro de cenários reais aos que ousam lidar com o assunto.

A perda da floresta tropical, juntamente com os fatores que contribuem para a sua degradação e as possíveis soluções, é um dos principais objetivos dos estudos atuais sobre conservação do ambiente, da mesma forma que interações e fatores que influenciam a distribuição e abundancia de organismos são o foco principal da Ecologia como ciência (KREBS, 1994).

Entretanto, antes de ser possível a tomada de decisões em macro escala, é preciso analisar os conhecimentos e metodologias existentes para lidar com assunto tão complexo.

Quando se discute gestão territorial de grandes paisagens e diversidade biológica é indispensável se falar de Ecologia da Paisagem e estudos sobre biogeografia de ilhas e metapopulações. Estes conceitos fundamentam-se na constatação de que o espaço é fragmentado, resultando em diversas configurações de uso da terra (matriz), ao mesmo tempo em que forma habitats naturais distintos e separados. Por conseguinte, existem habitats favoráveis e outros desfavoráveis à instalação ou manutenção de espécies.

Ecologia da Paisagem é a ciência que estuda as relações entre os padrões espaciais e os processos ecológicos, ou em outras palavras, estuda os fatores estáticos e dinâmicos de uma paisagem.

Permite a comparação entre paisagens, identificando as principais diferenças e determinando as relações funcionais e os padrões da paisagem. Pode ser agrupada em categorias ou índices de acordo com o foco do estudo e a escala desejada, como por exemplo, grandes domínios morfoclimáticos e fitogeográficos, biomas, bacias hidrográficas, área, densidade, forma, borda, distribuição, dispersão, justaposição, etc.

A Paisagem também pode ser entendida como o produto das interações entre os elementos de origem natural e humana, em um determinado espaço. Estes elementos da paisagem se organizam de maneira dinâmica, ao longo do tempo e espaço. Resultam daí feições e condições também dinâmicas, diferenciadas ou repetidas, o que permite uma classificação, ao agruparem-se os arranjos similares, separando-os dos diferentes. No todo, forma-se um mosaico articulado. Este processo poderá ser tão amplo ou detalhado quanto o interesse do observador (MAXIMIANO, 2004).

Paisagem não é o mesmo que espaço geográfico, mas pode ser compreendida como uma manifestação deste. O espaço é o objeto de estudo da geografia, enquanto que paisagem pode ser entendida como uma medida multidimensional de compreensão de um lugar (MAXIMIANO, 2002).

A configuração da paisagem está relacionada à distribuição em estudo dos elementos que a compõe (físicos – clima, relevo, vegetação - históricos, culturais, etc) (McGARIGAL & MARKS, 1995 apud PÉRICO et al., 2005). Os índices contribuem para o entendimento de espacialização dos fragmentos e seu grau de conectividade. TURNER (2005 apud PORTO, 2006) resume: “A Ecologia da Paisagem focaliza as recíprocas interações entre os padrões espaciais e os processos ecológicos, acentuadamente integrada à ciência Ecologia”.

Resumidamente, Biogeografia de ilhas é uma teoria que trabalha em uma escala mais ampla que a paisagem, como por exemplo, continentes ou o país todo. Seu enfoque principal é a riqueza de espécies. Foi elaborada por Mac Arthur e Wilson (1967) para prever o número de espécies que uma ilha de determinado tamanho pode suportar ou manter (GASCON et al., 2001 apud PÉRICO et al., 2005) Dentre várias questões, sua principal premissa é questionar se o número de espécies em um habitat ilha será determinado pelo tamanho desta mancha, bem como proximidade a outras manchas ou habitat fonte (PÉRICO et al., 2005).

Metapopulação já trabalha em uma escala de paisagem e estuda a dinâmica das populações. Conceitua-se no conjunto de populações distribuídas numa determinada região e conectadas através de movimentos migratórios; ou seja, é a população de populações. Dentro das manchas (fragmentos), os indivíduos estão sujeitos a processos de sobrevivência e reprodução, uma dinâmica local de sucesso ou fracasso reprodutivo, colonização e extinção (da SILVA, ____).

O processo ou modelo de desenvolvimento atual está levando à formação de paisagens contendo apenas manchas pequenas de áreas naturais. Estas manchas pequenas acabam por se tornar ambientes extremamente nevrálgicos para populações reduzidas, pois estas são altamente susceptíveis à extinção por uma série de razões, descritas a seguir.

Grupos mais exigentes ou que necessitem de habitats maiores terão menor probabilidade de sobrevivência em fragmentos florestais pequenos do que os grupos mais adaptáveis ou generalistas (COLLI et al., ____).

A persistência de espécies nestas paisagens depende de uma dinâmica regional, interconectando as distintas manchas, caso contrário estarão fadadas à erosão genética (endogamia) e ao desaparecimento. Esta dinâmica local está diretamente relacionada aos conceitos de local habitável e distância de dispersão, fatos extremamente importantes na persistência e sobrevivência das populações.

Essa necessária ligação entre as diferentes manchas e suas comunidades se revela um desafio para diversos grupos, pois obriga estes a atravessarem a matriz em busca de melhores locais de sobrevivência, alimentação, reprodução, etc. Isto pode limitar o potencial de dispersão das espécies e a colonização, uma vez que, como atestam FERNANDES & RODRIGUES (2003), muitas espécies do interior da mata não atravessam nem mesmo faixas estreitas de ambiente aberto devido o perigo de predação.

O problema é que quanto mais áreas forem desmatadas, somado às variáveis de distância entre os fragmentos, tipo de matriz, vulnerabilidade e adaptabilidade das espécies à esta, grau de dispersão, etc, menor será a taxa migratória proveniente das áreas fonte para os fragmentos.

Quando a dispersão animal é reduzida, plantas que dependem dos animais para dispersão de suas sementes também são afetadas. Desta forma, os fragmentos isolados de habitats não serão colonizados por muitas espécies nativas.

Em relação às espécies raras e endêmicas, estas apresentam maior suscetibilidade ainda ao desaparecimento devido ao seu alto grau de vulnerabilidade, decorrente de características intrínsecas à espécie, como distribuição restrita ou esparsa, além de relações extremamente complexas com o meio biótico e abiótico (BERKENBROCK et al., 2003), inclusive com outras espécies, possivelmente já extintas localmente.

Grande parte dos recursos genéticos, antes mesmo de seu completo conhecimento, vem sendo destruídos de forma irreversível, com alterações profundas e conseqüências desastrosas nos ecossistemas, exigindo medidas urgentes de conservação (KAGEYAMA, 1987 apud BERKENBROCK et al., 2003).

Segundo o mesmo autor, a variabilidade genética das populações está diretamente ligada ao fluxo gênico e, consequentemente, a estrutura genética das populações. A interrupção ou redução deste fluxo por diversos tipos de barreiras pode tornar as populações total ou parcialmente isoladas geneticamente, promovendo a endogamia (MARTINS, 1987 apud BERKENBROCK et al., 2003).

Este fato resulta em maior propiciamento de doenças deletérias e aumento da fragilidade da população em questão, muitas vezes pelo simples fato de não possuir mais adaptabilidade para enfrentar desafios. A conseqüência mais importante disso é a extinção de espécies.

Isto denota a importância da conectividade entre os remanescentes florestais habitados por estas populações. Uma das alternativas é a implementação de corredores ecológicos. Corredores ecológicos podem contribuir significativamente para a conservação da biodiversidade no Brasil.

Esta nova abordagem permite aumentar o fluxo gênico entre populações, através da conectividade entre as áreas, uma vez que esses corredores fornecem cobertura de mata, inclusive agindo como proteção quanto à alteração abrupta da mancha com a matriz (efeito de borda). METZGER et al. (1999 apud BREDA et al., 2003) comentam que os corredores servem também como suplemento de habitat e atuam como áreas de refugio para a fauna, em caso de perturbação nos fragmentos.

Se ocorrer fluxo gênico entre as populações espacialmente isoladas, a chance de sobrevivência a longo prazo é bem maior que sem fluxo gênico. Este “efeito resgate” reduz a probabilidade de extinção local, quando ocorre migração substancial entre as populações.

O pior cenário ocorre quando uma população é fragmentada em sub-populações espacialmente isoladas com pouca ou nenhuma migração entre elas, cada uma sendo tão pequena que os acidentes demográficos (flutuações de n) rapidamente conduzem à extinção (PIMM, 1991 apud SCARIOT, 1998).

O estudo da estrutura genética e da diversidade permite o conhecimento da organização e distribuição da variabilidade genética entre e dentro de populações naturais. Este entendimento é imprescindível para a escolha de estratégias que visem a conservação e manejo de populações naturais em seu habitat natural, com a perspectiva de manutenção da diversidade e garantia de sua sustentabilidade (OYAMA, 1993 apud BERKENBROCK et al., 2003).

Com isso, busca se evitar o empobrecimento geral da mancha, sua redução no tamanho, no grau de isolamento das populações, redução nas taxas de imigração ou mudanças nos padrões de dispersão, assim como mudanças na estrutura da comunidade e aumento nos efeitos de borda (SAUNDERS et al, 1991).

Por efeito de borda se entende as diversas conseqüências biológicas, ecológicas e físicas, decorrentes das modificações sofridas pela área de mata em questão. O efeito de borda impõe sérias restrições à manutenção das populações, na medida em que interfere com fatores espaciais com forte impacto nos processos ecológicos (PÉRICO et al., 2005), principalmente em relação à distribuição, comportamento e sobrevivência de espécies animais e vegetais.

Entre estes efeitos, pode-se citar efeitos internos e externos, altamente relevantes para o planejamento e manejo de reservas naturais. Efeitos internos relacionam-se ao tamanho efetivo do fragmento e a fatores ligados diretamente à formação da borda, onde os principais incluem: modificações abióticas: alterações das características físicas do meio, como micro clima (solo, umidade, luminosidade e temperatura); Modificações biológicas diretas: distribuição e abundância de espécies; e Modificações biológicas indiretas: interações entre espécies (predação, parasitismo, competição, polinização, transporte de sementes, etc.).

Fatores externos dizem respeito às influências externas do fragmento florestal, principalmente tipo de matriz e grau de isolamento. São as interações da paisagem em um nível (escala) mais amplo de configuração de habitat. Referem-se à dinâmica de uso do solo pelas comunidades antrópicas da região onde os fragmentos florestais remanescentes estão inseridos.

Outra questão é que na ausência de alguns elementos de fauna que funcionem como agentes de dispersão e polinização, muitos fragmentos florestais podem ser transformados em florestas vazias (REDFORD, 1992 apud GRELLE, 2003). O referido autor descreve o fato como “ecologia da exploração”, indicando a ocorrência de grandes alterações tanto na estrutura como na composição das florestas, a longo prazo. Isto certamente tem efeitos perniciosos sobre o equilíbrio ou estabilidade do ecossistema, assim como sobre as expectativas sobre sua sustentabilidade (AHRENS, 1997).

Uma possível conseqüência, em decorrência da perda destes grupos funcionais é o desaparecimento de cerca de 80 % das arvores nos trópicos, as quais são extremamente dependentes da dispersão realizada por vertebrados (GENTRY, 1982 apud GRELLE, 2003).


Investigando alguns caminhos


Dentre os vários temas possíveis de investigação, está o planejamento e implementação de técnicas sustentáveis, ou seja, um mosaico de usos da terra complementar e gerenciado de forma integrada, que permita conservar a diversidade e manter tanto a dinâmica dos processos ecológicos como a dinâmica sócio ambiental de um determinado território.

Entre os desafios de atribuir valores aos elementos da biodiversidade, reduzir os processos de fragmentação das paisagens naturais e buscar um desenvolvimento de forma sustentável está a necessidade urgente de aplicação dos instrumentos de gestão ambiental e gestão territorial de macro paisagens.

Um dos problemas enfrentados pelos conservacionistas atualmente é como identificar de maneira rápida e barata as áreas mais importantes para a conservação. O conhecimento atual sobre diversidade biológica do planeta é extremamente escasso, especialmente nas florestas tropicais. Isto se torna notadamente importante e preocupante se avaliado o ritmo atual de destruição dos ambientes naturais aliado às altas taxas de extinção das espécies.

Um grande esforço tem sido feito em todo o planeta para se mapear a biodiversidade (MYERS et al., 2000) já que para se traçar estratégias eficientes de conservação e proteção necessita-se, primordialmente, o conhecimento da distribuição das comunidades ecológicas (WILIAMS et al., 1997).

Da mesma forma, a biodiversidade não é só difícil de ser definida, mas os dados em escalas mais precisas de distribuição dos organismos são escassos e/ou muito caros de serem adquiridos em quantidades suficientes (WILIAMS & GASTON, 1994).

A manutenção dos processos evolutivos depende da conservação do maior numero possível de indivíduos, espécies e habitats (MYERS & KNOLL, 2001). Isto exige o desenvolvimento de estratégias de conservação e uso manejado dos fragmentos remanescentes, bem como recuperação das áreas degradadas.

A conservação de grandes áreas das florestas tropicais tem 2 objetivos principais: 1) diminuir as taxas de extinção de espécies e 2) possibilitar a continuidade dos processos evolutivos. Logo, a conservação de grandes áreas é fundamental para a manutenção dos processos naturais e, consequentemente, para a humanidade assegurar os serviços e benefícios da natureza (BROOKS et al., 2002).

O aumento na área geográfica conservada resulta no aumento do número de micro habitats, ou nichos ambientais. Consequentemente, o tamanho da área deve ter influência maior na diversidade de organismos. Por outro lado, um conjunto de pequenas porções de florestas, por amostrar maior heterogeneidade de nichos, pode, eventualmente, ter mais diversidade que uma reserva contínua de mesma área.

A criação de áreas protegidas pelo sistema de Unidades de Conservação Federal (UC’s) tem sido a estratégia principal de proteção da diversidade biológica, sendo que tal pratica foi oficialmente assumida pelos paises integrantes da Convenção sobre Diversidade Biológica (MMA, 1999 apud MACHADO et al., 2003).

DOUROJEANNI (2000) salienta que a América Latina possui o maior crescimento no que diz respeito à áreas protegidas, mas também se destaca pelo alto numero de conflitos sociais em relação ao estabelecimento e manejo destas áreas. CASTRO e colaboradores (2003) destacam que a maioria das UC’s existentes enfrentam vários problemas, entre eles, falta de recursos humanos, financeiros e situação fundiária não resolvida, o que coloca em questão a efetividade e a viabilidade a longo prazo da conservação destas áreas.

Uma das grandes questões divergentes é em relação à presença ou não de pessoas dentro de Unidades de Conservação. Dos dois lados há grupos e entidades públicas e não governamentais defendendo arduamente seu ponto de vista. De fato, os dois argumentos têm prós e contras. Se por um lado a presença de população humana pode acentuar uma pressão sobre os habitats naturais e sua degradação, por outro, estas mesmas pessoas podem se tornar agentes de proteção e fiscalização, inclusive protegendo contra invasões de grileiros e madeireiros, em um processo de extrativismo sustentável em níveis locais (sugestão de leitura: FEARNSIDE, 2003).

É neste contexto que se torna premente a necessidade de conhecer a relação das comunidades residentes em áreas contíguas às áreas protegidas e de que maneira afetam e são afetadas pela existência destas áreas. É necessário que a população entenda seu valor e possua um sentimento de pertencimento à natureza, para entender os motivos de preservar.

Por lei, as propriedades privadas são obrigadas a manter uma parcela específica da sua área como reserva legal, bem como áreas de preservação permanente (APP – se houver). Nas áreas de reserva legal, podem até mesmo serem empreendidas atividades de manejo, desde que seja mantida a cobertura florestal. Da mesma forma, proprietários rurais podem manter áreas para fins de conservação, obtendo assim, redução ou até isenção do Imposto Territorial Rural (ITR).

Os mais recentes estudos têm utilizado a percepção ambiental como forma de entender as diferentes relações do ser humano com o meio em que está inserido, principalmente em comunidades próximas às áreas de preservação da natureza (FONTANA & IRVING, 2003).

Segundo MACDOWELL & SPARKS (1989 apud GUIMARÃES & DE MARCO, 2003), conhecer a atitude e o comportamento de proprietários rurais em relação à conservação é um importante passo na pesquisa sobre a conservação de ecossistemas naturais em propriedades rurais.

Entretanto, quando pegamos como exemplo dados do uso do solo nas áreas limítrofes da fronteira agrícola, dentro ou adjacentes de áreas mais preservadas do país, entendemos que ir contra os interesses de grandes agropecuaristas e suas representações no senado e câmara dos deputados é uma tarefa nada fácil. Atualmente, só para exemplo, o centro-oeste do Brasil detém o maior rebanho bovino nacional, produzindo 53% da soja, 40% do milho, 50% do café e 80% do algodão que é produzido no país (KLINK, 2003). A maioria da produção é exportada.

A dimensão e importância econômica que os dirigentes públicos dão a estas exportações (principalmente em relação ao mercado externo de commodities) colocam em segundo plano quaisquer valores ou princípios ambientalistas, na pirâmide de prioridades das políticas públicas para “grandes áreas utilizáveis”.

O desenvolvimento econômico de uma região sempre modificará a estrutura e o funcionamento dos ecossistemas naturais, porém uma melhor compreensão do funcionamento do ecossistema, aliada ao manejo e investimento apropriados poderá diminuir os efeitos ambientais negativos.

O mundo enfrenta o desafio de conciliar conservação com desenvolvimento e o paradigma dominante de desenvolvimento econômico, baseado no crescimento infinito, é fundamentalmente incompatível com a sustentabilidade social e ecológica (REES, 2003).

A aliança do conhecimento científico com políticas públicas, relacionadas ao uso e ocupação do solo, é extremamente necessária para evitar uma degradação ambiental impetuosa e violenta, bem como para manejar as áreas naturais que irão enfrentar grande onda de pressão no futuro.

As ações econômicas, sociais, políticas e ambientais decidirão sobre o destino das espécies e dos mecanismos que sustentam a vida.

Com tudo que foi citado, embora cada tópico propiciasse dissertações infinitas, pode-se concluir da extrema importância que o assunto exerce na atual dinâmica evolutiva das sociedades contemporâneas. É preponderante mais estudos sobre as complexas relações dos ecossistemas, assim como os impactos antrópicos e suas conseqüências, para que, em última análise, se possa avaliar a viabilidade da própria evolução humana neste plano material.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALMEIDA, D.R.; Carvalho, L.C.; Rocha, C.F.D. As bromélias da Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ: composição e diversidade de espécies em três ambientes diferentes. Bromélia. 1998. P.5:55-65.

AHRENS, S. Sobre o Manejo Florestal Sustentável de Uso Múltiplo: Proteger a fauna para conservar as florestas. Planejamento da Produção e Manejo Florestal, EMBRAPA Florestas. Paraná. 1997.

BARRIOS, S. A Produção do Espaço. In: A Construção do Espaço. In: SOUZA, M. A., SANTOS, M. A construção do Espaço. Ed. Nobel, 1986.

BERKENBROCK, I. S.; REIS, A.; GAIO, M. F. Diagnóstico Ambiental de Espécies Raras e Endêmicas. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 150. Fortaleza, 2003.

BREDA, G. B.; INDRUSIAK, C.; FARIA-CORREA, M.; HARTZ, S. M. Presença de Puma Concolor (Linnaeus, 1771) na região metropolitana de Porto Alegre, RS. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 127. Fortaleza, 2003.

BROOKS, T. M.; MITTERMEIER, R. A.; MITTERMIEIER, C. G.; FONSECA, G. A. B.; RYLANDS, A. B.; KONSTNAT, W. R.; FLICK, P. e HILTON-TAYLOR, C. (2002). Habitat loss and extinction in the Hotspots of Biodiversity. Conservation Biology. 16 (4): P. 909-923.

CASTRO, C. R.; REED, P. G.; FERREIRA, M. S. L.; do AMARAL, A. O. M. Caatinga: um bioma brasileiro desprotegido. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 68. Fortaleza, 2003.

COLLI, G. R.; ACCACIO, G. M.; ANTONINI, Y.; CONSTANTINO, R.; FRANCESCHINELLI, E. V.; LAPS, R. R.; SCARIOT, A.; VIEIRA, M. V.; WIEDERHECKER, H. C. A fragmentação dos ecossistemas e a biodiversidade brasileira: uma síntese. Cap. 12. Disponível on line. ____.

da SILVA, J. A. L. Sincronização em Metapopulações. Departamento de Matemática Pura e Aplicada Programa de Pós Graduação em Matemática Aplicada e Computacional. Universidade Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre RS Brasil. ____.

DOUROJEANNI, M. Conflictos Sócio-Ambientales en Unidades de Conservación de America Latina. In: Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. Campo Grande, MS. Anais Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. v. 1. P.37 – 56. 2000.

FEARNSIDE, P. M. Política de conservação na Amazônia brasileira: entendendo os dilemas. Coordenação de Pesquisas em Ecologia-CPEC. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-INPA. 2003.

FERNANDES, F. R. & RODRIGUES, A. A. F. Avifauna da Reserva Santo Amaro, Município de Urbano Santos, Maranhão, Brasil. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 116. Fortaleza, 2003.

FONTANA, A. & IRVING, M. A. Ao redor da natureza: percepção ambiental no entorno da estação biológica de Santa Lúcia, Santa Teresa – ES. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 37. Fortaleza, 2003.

GENTRY, A.H. (1982) Patterns of Neotropical plant species diversity. Evolutionary Biology. 15: 1-84.

GUIMARÃES, F. P.; DE MARCO, P. J. Atitude e comportamento de proprietários rurais em relação às leis ambientais e qualidade ambiental em riachos na região de Viçosa – MG. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 140. Fortaleza, 2003.

GRELLE, C. E. V. Desmatamento e a Vulnerabilidade à Extinção dos Mamíferos Amazônicos: Algumas Projeções para o Futuro. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 65. Fortaleza, 2003.

KAGEYAMA, P. Y. Conservação in situ de recursos genéticos de plantas. IPEF, v. 35. P. 7-37. 1987.

KLINK, C. A. Dinâmica do Uso da Terra no Cerrado e Interações com a Amazônia. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil. Cap. 5. Interação BiosfAtmosf na Amazônia, Programa LBA. Fortaleza. P. 613. 2003.

KREBS, C.J. Ecology: The experimental analysis of distribution and abundance. 4th Ed. HarperCollins College Publishers, USA. 1994.

LEITÃO FILHO, H. de F. Aspectos taxonômicos das florestas do Estado de São Paulo. Anais do Congresso Nacional sobre essências nativas. Silvicultura em São Paulo, V.16, P.197-206. 1982.

MACHADO, R. B.; SILVEIRA, L.; JÁCOMO, A. T. A.; RAMOS NETO, M. B.; MOREIRA, R. A. A definição de áreas prioritárias para conservação por meio da integração de dados de biodiversidade e dados ambientais. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 260. Fortaleza, 2003.

MARTINS, P. S. Estrutura populacional, fluxo gênico e conservação in situ. IPEF, v. 35, p. 71-84. 1987.

MAXIMIANO, L. A. Classificação de paisagens no norte de Campo Largo − Paraná, segundo sua condição socioambiental. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2002.

MAXIMIANO, L. A. Considerações sobre o conceito de paisagem. R. RA´E GA, Curitiba, n. 8. Editora UFPR. P. 83-91. 2004.

MACDOWELL. C. & SPARKS. R. The multivariate Modelling and Prediction of Farmers’ Conservation Behavior Towards Natural Ecosystems. In: Journal of Environmental Management. v. 28, P. 185-210. (1989)

MCGARIGAL, K & MARKS, B. J. Fragstats: spatial patterns analysis program for quantifiying landscape structure. Portland: USDA, Forest Service, Pacific Northwest Research Station, 122p. 1995.

METZGER, J.P.; GOLDENBERG, R.; BERNACCI, L.C. Caminhos da biodiversidade. Ciência Hoje 25(146), 62-64. 1999.

MMA – Ministério do Meio Ambiente. A Convenção sobre Diversidade Biológica. Série Biodiversidade. no. 1. Brasília-DF. 32 pp. 1999.

MYERS, N.; MITTERMEIER, R. A.; MITTERMEIER, C. G.; FONSECA, G. A. B.; KENT, J. Biodiversity Hotspots for Conservation Priorities. Nature 403:853-858. 2000.

MYERS, N. & KNOLL, A.H. (2001) The biotic crisis and the future of evolution. Proceedings of National Academy of Sciences. 98: 5389- 5392.

OYAMA, K. Conservation Biology of Tropical Trees: Demographic and Genetic Considerations. Enviroment Update, v. 1, p. 17-32, 1993.

PÉRICO, E.; CEMIN, G.; de LIMA, D. F. B.; REMPEL, C. Efeitos da fragmentação de hábitats sobre comunidades animais: utilização de sistemas de informação geográfica e de métricas de paisagem para seleção de áreas adequadas a testes. Anais XII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Goiânia, Brasil, 16-21 abril. INPE, P. 2339-2346. 2005.

PIMM, S.L. The balance of nature? Chicago: University of Chicago Press, 1991.

PORTO, M. L. O que há de novo em ecologia de paisagem? Departamento de Ecologia – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. 2006.

REDFORD, K. Empty forest. Bioscience 4: 412-422. 1992.

REES, W. E. Economic development and environmental protection: an ecological economics perspective. Environmental monitoring and assessment 86. 2003. P. 29-45.

ROSSINI, R.E. A Produção do novo espaço rural: pressupostos gerais para a compreensão dos conflitos sociais no campo. In: SOUZA, M. A., SANTOS, M. A construção do Espaço. Ed. Nobel, 1986. P.99.

SAUNDERS, D. A.; HOBBS, R. J. & MARGULES, C. R. Biological Consequences of Ecosystem Fragmentation: A Review. Conservation Biology, v.5, p.18-32, 1991.

SHIMBORI, E. M.; ROQUE, F. O.; YAMADA, M. V.; ONODY, H. C.; AROUCA, R. G.; GOMES, S. A. G.; BITTAR, T. B.; PEPINELLI, M.; BARBOSA, C. C.; PENTEADO-DIAS, A. M.. Conservação da Biodiversidade: Um ensaio sobre o desafio da integração entre sistematas e ecólogos. Anais do VI Congresso de Ecologia do Brasil, Vol. I. Biodiversidade, Unidades de Conservação, Indicadores Ambientais. P. 95. Fortaleza, 2003.

SINGER, P. Divisão Internacional do trabalho e empresas multinacionais. Cebrap. São Paulo, s.d., mimeo, 1973.

SCARIOT, A. Conseqüências da fragmentação da floresta na comunidade de palmeiras na Amazônia central. Centro Nacional de Recursos Genéticos - CENARGEM/ EMBRAPA. Série Técnica IPEF. v. 12, n. 32, p. 71-86, dez. 1998.

TERBORGH, J. Center of Tropical Conservation Dulke University. In: HAGAN, J.M., JOHNSTON, D.W. Ecology and Conservation of Neotropical Migrant Landbirds. Introduction to Manomet Symposium. P. 07-09; 1992.

TURNER, M.G. Landscape Ecology: What is the State of the Science? Annu. Rev. Ecol. Evol. Syst. 36: 319-44. 2005.

WILLIAMS, P. H.; GASTON, K. J.; HUMPHRIES, C. J. Mapping Biodiversity Value Worldwide: Combining Higher-taxon Richness From Differend Groups. Proc. R. Soc. Lond. B 264:141-148. 1997.

WILLIAMS, P. H. & GASTON, K. J. Measuring more of biodiversity: can higher-taxon richness predict wholesale species richness? Biological Conservation, 67:211- 217. 1994.



Amigos,

Encaminho EM ANEXO um “artigo/revisão bibliográfica” que elaborei.

"A fragmentação do ambiente e a viabilidade das futuras gerações"

Sugiro imprimir este corpo de mail, assim como o artigo EM ANEXO, para facilitar a leitura. Cada parágrafo traz informações bem importantes.

Toda vez que discutimos assuntos complexos, “corremos o risco” da problematização. Isto ocorre principalmente quando o assunto em questão envolve opiniões, especialmente aquelas vinculadas às crenças, à fé e à política.

As pessoas se sentem, inclusive, agredidas ou ofendidas diante de alguns pontos.

Algumas pessoas me consideram um “metido” quando exponho minhas idéias de maneira enfática, como foi o ultimo texto que elaborei (“cheio de paixões” como me disse um amigo).

Por isso, desta vez (livre de paixões), venho fundamentado.

Neste texto EM ANEXO, trago elementos provocadores e desafiadores. E o objetivo é esse mesmo: provocar questionamentos e discussões.

E “quanto mais progride a problematização mais penetram os sujeitos na essência do objeto problematizado e mais capazes são de desvelar esta essência” (FREIRE, 1980, p. 89).

Alguns podem achar demasiada a quantidade de referências bibliográficas. Mas daí questiono, como já disse o poeta: “Quais são as palavras que nunca são ditas?” Se autores de renome disseram de maneira perfeita determinado ponto, por que não citá-los?

Mas a minha intenção com esta provocação ou problematização é DIALOGAR.

Por que, afinal, como disse Paulo Freire na “Matriz Dialógica” : “é a partir do diálogo que é possível problematizar a realidade”.

Minha intenção nada mais é do que dialogar.

(...) o diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o encontro em que se solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar idéias de um sujeito no outro, nem tão pouco tornar-se simples troca de idéias a serem consumidas pelos permutantes. (FREIRE, 1983, p. 79).

(...) ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo, pelos objetos cognoscíveis (...) (FREIRE, 1983. P. 79).

“O ser humano aprende na relação com o outro, com o mundo, mediatizados pelo ato de conhecer, produzindo saberes em relação a contextos”. (ECCO, 2004, p. 38).

A condição necessária para a indagação está assentada no diálogo. E, mediante a intercomunicação, a troca de saberes, os conhecimentos mitificados e ingênuos são superados.

A reflexão conjunta e a troca de idéias permitem o surgimento de uma consciência crítica sobre a realidade, abandonando a consciência ingênua predominante.

O mesmo autor é lembrado na passagem: “(...) através do diálogo podemos olhar o mundo e a nossa existência em sociedade como processo, algo em construção, como realidade inacabada e em constante transformação”.

Ao ser consciente implica o agir consciente sobre a realidade constituindo a unidade dialética entre ação-reflexão, teoria e prática. O sentido inovador e instigante da proposta freireana consiste em conceber o conhecimento crítico-humanizador na perspectiva de cultivar a abertura do ser humano enquanto ser inacabado.

A educação deve ser processo de humanização do mundo, pois conhecimento com sentido serve de instrumento de intervenção crítica e criativa no mundo para transformá-lo e humanizá-lo. A educação é um processo guiado por ações planejadas, intencionais, que buscam a superação do nível da consciência ingênua para a posição de criticidade.

Não podemos ser meros observadores da realidade. E em cada vez que expressamos nossa opinião ou atuamos na educação, sempre estará presente o ato político. Não há educação neutra, pois toda educação é um ato político, bem como qualquer pratica política é pedagógica.

A intervenção da realidade é o ponto central deste principio, onde todos passam a se considerar atores do contexto, atuando de diversas formas nesta realidade. O movimento de observação da realidade, a reflexão sobre seu papel social, histórico e político nesta realidade, a readmiração da importância de suas ações e, finalmente, a intervenção dentro de seu contexto, molda o método de Freire como uma metodologia eminentemente política.

- Para que as pessoas se tornem capazes de transformar seu próprio mundo politicamente, é necessária uma ampliação de sua visão de mundo e este processo só pode ser alcançado através do diálogo. Através do diálogo, as pessoas são desafiadas a refletir sobre seu papel na sociedade. -

Ainda ressaltando a “Matriz Dialógica”, faz-se necessário propor aos sujeitos o desafio de cultivar uma postura dialógica e crítica diante do mundo, que os faça ter compromisso em assumirem-se enquanto seres epistemologicamente curiosos diante dos fatos, realidades e fenômenos que constituem o próprio mundo.

Os sujeitos que dialogam abrem-se para o novo e sabem que há sempre algo a interpretar, descobrir, aprender, dizer e a compartilhar. São abertos a questionamentos e não temem conflitos. Quanto mais o sujeito pergunta, mais sente que sua curiosidade não se esgota.

Submeter as ações ao questionamento requer abertura e reconhecimento de que não há saber absoluto, nem ignorância absoluta. Abertura para descobrir que há sempre novas realidades e/ou elementos a descobrir, novos conhecimentos, caminhos e perspectivas múltiplas de ação, considerando diferentes contextos e sujeitos.

A realidade deve ser compreendida pelo diálogo crítico problematizador que brota das comunidades humanas em suas experiências vitais, concretas. O processo de construção do conhecimento é visto como um todo e se constitui numa relação dialógico-comunicativa.

O homem não vive isolado, ele pensa, age, fala, comunica-se com os outros. Por isso, Freire diz que não é o sujeito que fundamenta o seu pensar, mas a presença dos outros. É o pensamento coletivo que explica o saber individual. O processo de conhecer implica compromissos éticos e políticos, de intervenção crítica no mundo. A epistemologia freireana é revolucionária constituindo-se na unidade dialética entre ação-reflexão-ação (práxis), que requer testemunho da ação (coerência).

O sentido revolucionário de conscientização constitui-se em processo educativo e epistemológico na libertação do ser humano das amarras que o oprimem e da visão ingênua do mundo que o cerca. Consiste no desenvolvimento crítico da tomada de consciência. O desenvolvimento da consciência crítica se dá pela educação problematizadora- libertadora, num processo dialético-dialógico da busca permanente de reelaboração do conhecimento e da transformação ético-política da realidade histórico-cultural.

Promover um estudo da realidade, sua compreensão e representação numa visão de totalidade é romper com o senso comum. Isso ocorre assumindo uma postura crítica e a problematização constante.

“Desafiar constantemente é uma das características do ato de educar; do contrário, contribui-se para o obscurantismo, para o ‘silenciar’ de consciências”. (ECCO, 2004, p. 69).

A Leitura de Mundo tem importância fundamental na vida das pessoas. Entendemos, com Luckesi (2003, p. 119) que “[...] a leitura, para atender o seu pleno sentido e significado deve, intencionalmente, referir-se à realidade. Caso contrário, ela será um processo mecânico de decodificação de símbolos”. Ler o mundo consiste em problematizar, analisar e compreender a realidade em que estamos inseridos.

A partir da leitura de mundo, os seres humanos abertos aos diferentes objetos cognoscíveis presentes na realidade que os cerca, são capazes de transcender suas percepções já elaboradas e atingir novos níveis de percepção da realidade, ampliando conhecimentos.

O sujeito cognoscente é um ser situado em sua cultura, sociedade e instituições a que pertence existencialmente. Logo, sua consciência não é vazia, porém condicionada pelo contexto.

A inquietação indagadora (o ato de perguntar) é a condição primordial para estimular o desejo de conhecer, o desejo de buscar esclarecimento, superando assim o pensamento ingênuo, alienado/alienante. No entanto, a passagem da ingenuidade para a criticidade não se dá automaticamente.

{[ Ah ! Pois é .... ]}

(...)

A possibilidade dessa prática, como citada anteriormente, conforme analisa Zitkoski (2000, p. 215) “[...] requer o compromisso do ser humano de assumir-se enquanto ser epistemologicamente curioso diante dos fatos, realidades e fenômenos constitutivos de seu próprio mundo [...]”.

- Conhecer, problematizar a realidade significa investigar, pesquisar, desvelar e interagir. É desafiar as pessoas a pensar criticamente numa perspectiva de globalidade, conhecer melhor o que já conhecem, levantarem hipóteses, confrontarem teorias, idéias e posições e tirarem suas próprias interpretações dos fatos, resolvendo problemas. -

Desencadear a atividade intelectual e desafiá-los a atingirem níveis cada vez mais profundos e amplos do saber. Dialogando, oportuniza o encontro dos sujeitos que questionam determinada realidade. Colocar o mundo como objeto de conhecimento significa provocar as pessoas a compreenderem de modo crítico a sua ação e a de outros sujeitos sobre o contexto histórico.

Sobre o texto EM ANEXO:

Começo o texto contextualizando uma escala mais ampla de realidade, em um nível planetário, apenas para mostrar que há muito mais entre o céu e a terra do que nos diz o elaborado argumento civilizatório/colonialista atuante sobre as massas hoje em dia, inclusive vastamente presente nos dogmas religiosos.

Acredito em uma visão mais abrangente, antropológica e “até mesmo biológica “ da presença do ser humano em sua etapa evolutiva no Planeta Terra.

Após, explico como se criaram as instituições e a Ordem Estabelecida. Para entender como tudo começou especialmente no Brasil, onde as velhas oligarquias, desde as capitanias hereditárias do período colonial, ainda detém a concentração de terra, o poder econômico e o poder parlamentar.

Os mesmos grupos do período inicial da “colonização do Brasil(ou descobrimento ??) são os mesmos orientadores das políticas de uso e ocupação das terras utilizáveis, assim como toda a política de créditos e incentivos clientelistas.

Comento o resultado e as transformações desta linha de ação sobre o ambiente e os problemas gerados a partir daí.

A questão da preservação do ambiente, por conseguinte, se revela não somente em uma ideologia “eco-politicamente correta”, mas em uma ação urgente a fim de viabilizar a nossa própria viabilização como espécie neste planeta.

As transformações decorrentes do uso mal planejado do ambiente causam, em última análise, o desequilibro climático e estão afetando (e afetarão ainda muito mais) as condições de homeostase da vida na Terra.

Quando comento sobre gestão de macro paisagens, comento sobre alguns conceitos importantes para entender o assunto, tais como: Ecologia da Paisagem, Biogeografia de lhas e Metapopulações.

Talvez numa análise rápida, seja apenas “mais um texto” sobre “efeito de borda”, como tantos por aí.

Mas não considero assim. Entro neste assunto apenas para mostrar que há muito mais coisa envolvida e que o nosso conhecimento a respeito do ambiente é pífio frente as milhões de variáveis inerentes ao tema.

- A questão principal do tema é como a fragmentação de habitats (em ilhas) põe em risco a vida de todas as espécies, simplesmente por uma questão de fisiologia básica: A floresta, juntamente com a fauna, regula o clima. PONTO FINAL. -

Quando se investiga alguns pontos, observa-se que, mesmo com o esforço de ambientalistas, a discussão não evolui como deveria, simplesmente pelo fato do paradigma dominante ser extremamente alicerçado e difícil de ser mudado.

Ainda mais no tocante a “ÁREAS UTILIZÁVEIS”, onde os grupos dominantes decidem como serão as transformações, as políticas, créditos, etc..., enfim: os rumos a serem seguidos.

Por aqui já soma um novo assunto (para outro artigo): a questão da revisão do código florestal e as reservas legais das propriedades. Mais uma vez a discussão do uso da terra e seu planejamento. Por incrível que pareça, estes grupos dominantes acreditam que podem viver sem o ambiente, direcionando áreas utilizáveis somente em prol de uma agricultura forte! A natureza é um inimigo a ser vencido, um problema, algo supérfluo (a sujeira do campo...).

O argumento principal dos grupos sociais hegemônicos é a questão da renda perdida nas áreas utilizáveis “abandonadas” a título de reserva legal. Em relação a este assunto, já está em curso outro artigo, juntamente com o sociólogo Diego Airoso, sobre a diversidade de opções geradoras de renda na pequena e média propriedade rural. A agricultura familiar já responde em valores atuais por cerca de 10 % do PIB nacional, aproximadamente 180 bilhões de reais por ano, R$ 85 bilhões somente o RS (o total do agronegócio brasileiro gera cerca de 30 % do PIB).

Ou seja: existem opções de conciliar ambos os lados, preservação (com manejo) e ganhos econômicos e sociais. A questão principal é O MÉTODO. Mas isto entrará em outro artigo.

Resultado: quem pensa diferente não tem voz. E o povo é levado cada vez mais a ser burro e passivo em relação a tudo, enquanto as mídias impressas ou áudio-visuais estampam em primeira página manchetes completamente PARCIAIS e TENDENCIOSAS, contribuindo ainda mais para a ignorância e a alienação (mentes colonizadas, como diz Bautista Vidal).

Embora pareça que a finalidade do texto EM ANEXO seja meramente alarmar catastroficamente uma situação iminente, saliento que não é este o caso.

O objetivo central é gerar uma discussão sobre as saídas existentes. E uma delas é a conscientização. Pouquíssimas pessoas pensam no assunto com a importância que deveriam.

A única mensagem alarmante que deixo é o fator TEMPO.

Quanto tempo será necessário para que um número significativo de pessoas deixe de tratar este assunto como tema de ficção científica de filmes de Hollywood?

Quanto de ambiente ainda será necessário fragmentar para entendermos a importância do Planeta como um ser vivo, que respira e pulsa, servindo como carne, onde a espécie humana age como uma bicheira, parasita burro, pois mata seu hospedeiro. Se este hospedeiro (Planeta) é impossibilitado de executar seus processos naturais de maneira harmônica, o desequilíbrio é visível.

(...)

Volto a citar Paulo Freire:

“A reflexão conjunta e a troca de idéias permitem o surgimento de uma consciência crítica sobre a realidade, abandonando a consciência ingênua predominante”.

“A condição necessária para a indagação está assentada no diálogo. E, mediante a intercomunicação, a troca de saberes, os conhecimentos mitificados e ingênuos são superados”.


Boa leitura. Aguardo resposta.

ATT,

Eduardo Alves

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

CORDENONSI, A. Z., MÜLLER, Felipe Martins, BASTOS, Fábio da Purificação de. “A Matriz Dialógica Problematizadora como uma Estrutura para o Exame e a Discussão Temática de uma Disciplina de Graduação Mediada por Tecnologia” In: Atas da IV Escola de Verão sobre Investigação-Ação Educacional. UFSM, Santa Maria, RS, 1999.

DAMKE, Ilda Righi. O processo do conhecimento na pedagogia da libertação: as idéias de Freire, Fiori e Dussel. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

_________ Educação e mudança. 23. ed. Rio de Janeiro; Paz e Terra, 1979.

_________Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 7 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

_________ Política e Educação. 4. ed. São Paulo, Cortez, 2000.

ECCO, Idanir. A prática educativa escolar problematizadora e contextualizada: uma vivência na disciplina de história. Erechim, RS: EdiFAPES, 2004.

ECCO, Idanir. O conhecimento na pedagogia freireana como suporte teórico para a educação escolar formal. URI – Campus de Erechim/RS. idanir@uri.com.br.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 13. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

LUCHESI, C. C. (et. al.) Universidade: uma proposta metodológica. 13. Ed. São Paulo: Cortez, 2003.

STRECK, Danilo R, REDIN, Euclides, ZITKOSKI, José (org). “Dicionário Paulo Freire”. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

ZITKOSKI, Jaime José. Horizontes da refundamentação em educação popular. Frederico Westphalen: Ed. URI, 2000.